domingo, 5 de junho de 2011

Saúde de Piracicaba pede socorro

Reportagem de Nikolas Capp

Seis horas da manhã, José Antônio chega ao pronto-socorro da Vila Cristina. A mulher dele, Maria Aparecida, está com um inchaço na boca e sente muita dor. Em meia hora ela passa por uma triagem e depois aguarda o atendimento.

Seis horas depois, José Antônio continua no mesmo pronto-socorro sem que ninguém tenha dado um diagnóstico para sua mulher. "A gente chega cedo e tem que passar o dia aqui para na hora da consuta o médico passar um remédio sem nem olhar direito o paciente. Perdemos o dia inteiro por nada", explica seu José, enquanto fuma um cigarro sentado em um banco do outro lado da rua do PS.

José pediu para que seu sobrenome não fosse revelado, mas a sua situação retrata a de muitas outras pessoas que procuram as Unidades de Pronto Atendimento de Piracicaba. No total, são quatro unidades na cidade e em todas existem reclamações desse tipo.

Percorri os quatro locais e a conclusão é de que o "pronto atendimento" fica somente no nome do serviço, responsável, pelo menos na teoria, por receber os casos mais graves. Durante cinco horas, poucas pessoas obtiveram êxito em ser atendidas e o número de pacientes só aumentou. Cerca de 40 pessoas aguardavam atendimento na unidade da Vila Cristina, enquanto dois clínicos gerais e um pediatra se desdobravam para dar conta da demanda. A situação na sala interna também era a mesma, já que as enfermeiras chamavam cinco pessoas por vez para aguardar na parte de dentro, mas poucos saíam.

A paciente Sabrina Rodrigues conhece bastante como funciona o local. Ela chegou por volta das 9h30 ao pronto-socorro e repetia o mesmo nos últimos quatro dias para tomar soro, por conta da dengue que deixava seu corpo fraco e dolorido. Como não tem com quem deixar o filho de 4 anos, leva o menino junto. "Ele não quer ficar parado e eu estou com dor, não consigo ficar andando atrás dele. É o quarto dia que venho tomar soro e a fila é sempre essa". Foram três horas de espera até Sabrina ir para a triagem e ser atendida.

Outras UPAs

A situação encontrada na Vila Cristina se repete pelas outras unidades, que ficam no Piracicamirim, Vila Sônia e Vila Rezende. O primeiro é o mais próximo do Centro. Em plena quinta-feira, eram cerca de 50 pessoas aguardando atendimento para um clínico geral e um pediatra.

Ederson Morais estava com um inchaço na virilha e não conseguia andar. "Cheguei aqui nove horas da manhã, são uma hora da tarde e ninguém me chamou ainda. Ninguém é chamado, não sou só eu', comenta o caldeireiro, que estava perdendo o dia de serviço e por isso desistiu do atendimento. "Vou embora, não adianta ficar aqui parado, vou procurar outro lugar para ser atendido", se resigna.

No pronto atendimento da Vila Rezende as pessoas procuravam sombras do lado de fora do local, já que o sol castigava a espera. Silvia Araujo acompanha a mesma cena todos os dias. A assistente de limpeza trabalha em uma farmácia que fica em frente ao PS. "Todos os dias fica lotado e as pessoas ficam aí esperando", conta Silvia.

Por acompanhar tão de perto a situação, ela resolveu pagar um seguro de saúde, mas não escapou da falta de atendimento. "Tive que levar minha neta que estava com bronquite há alguns meses. Se eu não brigo com a enfermeira passaríamos a noite toda lá sem ninguém nem olhar para a gente".

Falta Médico

O coro entoado pelos pacientes é engrossado pelos próprios médicos que atuam no serviço. A demora no atendimento e a pouca atenção dada a cada doente é constatada por aqueles que não conseguem dar conta de toda a demanda.

"Não tem como dar conta. Somos poucos para tanta gente e os médicos não querem vir trabalhar aqui. O salário pago é muito baixo e não atrai os interessados", explica Ademir Alamino Lacalle Junior, plantonista da UPA.

Segundo o médico, como faltam funcionários, os plantonistas precisam trabalhar acima da carga de trabalho normal, o que prejudica ainda mais o atendimento. "Os médicos estão cansados e têm que atender cerca de 80 pacientes por dia, quando normalmente atenderíamos a metade disso. Não existe possibilidade de atender a todos e dar uma qualidade na consulta", explica.

A situação é comprovada pelo último concurso aberto pela prefeitura para tentar sanar o problema. Não existiram inscrições suficientes para ocupar as 13 vagas abertas.

"Com o salário que estão dispostos a pagar dificilmente conseguirão completar o quadro de funcionários. Nenhum médico está disposto a trabalhar praticamente de graça", afirma Junior.

Os problemas não param por aí. Segundo João Auguto Scarazatti, outro médico plantonista, a falta de profissionais não é a única questão, mas também há falta de vagas para transferência de pacientes graves e funcionários fazendo funções que não competem aos cargos para que foram contratados.

"As vezes temos que transferir um paciente e não conseguimos. Ele tem que ficar lá e isso atrasa também o atendimento. Sem contar que alguns médicos contratatos para fazer plantão, que ganham mais, fazem outras funções. Não tem como dar conta da demanda desse jeito", afirma Scarazzati.

O outro lado

A Prefeitura de Piracicaba, por meio da assessoria de imprensa da Secretaria de Saúde, diz que as UPAs são para atendimento de urgência e demanda espontânea. Quando existem casos de emêrgencia, os outros não tão graves devem esperar por atendimento, ou procurar outros serviços mais apropriados como as UBSs (Unidades Básica de Saúde) e PSFs (Programas de Saúde da Família).

Em relação às reclamações dos médicos, a prefeitura disse ter contratado plantonistas adicionais para cobrir férias e afastamentos. Isso fez com que aumentasse o número para quatro médicos nos horários de pico. Os salários, segundo a secretaria, foram atualizados no ano passado, com as reivindicações dos médicos. Atualmente, um plantonista recebe R$ 804,73 para oito plantões e, acima disso, o valor passa para R$ 824,73 durante a semana. Nos fins de semana o valor sobre para R$ 840,42 e R$ 860,42.

Quanto às solicitações de vagas hospitalares, as mesmas são reguladas pela Central de Vagas da Secretaria de Saúde. Essas vagas hospitalares provêm de dois hospitais: Fornecedores de Cana e Santa Casa de Misericórdia de Piracicaba, e sempre são encontrados leitos mediante a solicitação médica, informa a nota.

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